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piano patterns n°1
06:11
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Um dia, num restaurante, fora do espaço e do tempo,
Serviram-me o amor como dobrada fria.
Disse delicadamente ao missionário da cozinha
Que a preferia quente,
Que a dobrada (e era à moda do Porto) nunca se come fria.
Impacientaram-se comigo.
Nunca se pode ter razão, nem num restaurante.
Não comi, não pedi outra coisa, paguei a conta,
E vim passear para toda a rua.
Quem sabe o que isto quer dizer?
Eu não sei, e foi comigo …
(Sei muito bem que na infância de toda a gente houve um jardim,
Particular ou público, ou do vizinho.
Sei muito bem que brincarmos era o dono dele.
E que a tristeza é de hoje).
Sei isso muitas vezes,
Mas, se eu pedi amor, porque é que me trouxeram
Dobrada à moda do Porto fria?
Não é prato que se possa comer frio,
Mas trouxeram-mo frio.
Não me queixei, mas estava frio,
Nunca se pode comer frio, mas veio frio.
Fernando Pessoa
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piano patterns n°2
03:23
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Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Fernando Pessoa
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piano patterns n°3
03:48
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Ah, tudo é símbolo e analogia!
O vento que passa, a noite que esfria,
São outra cousa que a noite e o vento –
Sombras de vida e de pensamento.
Tudo o que vemos é outra cousa.
A maré vasta, a maré ansiosa,
É o eco de outra maré que está
Onde é real o mundo que há.
Tudo que temos é esquecimento.
A noite fria, o passar do vento
São sombras de mãos, cujos gestos são
A ilusão madre desta ilusão.
*
Tudo transcende tudo.
E é mais real e menor do que é.
Fernando Pessoa
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piano patterns n°4
03:14
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A morte é a curva da estrada,
Morrer é só não ser visto.
Se escuto, eu te oiço a passada
Existir como eu existo.
A terra é feita de céu.
A mentira não tem ninho.
Nunca ninguém se perdeu.
Tudo é verdade e caminho.
Fernando Pessoa
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piano patterns n°5
02:53
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Do vale à montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por casas, por prados,
Por quinta e por fonte,
Caminhais aliados.
Do vale à montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por penhascos pretos,
Atrás e defronte,
Caminhais secretos.
Do vale à montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por plainos desertos
Sem ter horizontes,
Caminhais libertos.
Do vale à montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por ínvios caminhos,
Por rios sem ponte,
Caminhais sozinhos.
Do vale à montanha,
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por quanto é sem fim,
Sem ninguém que o conte,
Caminhais em mim.
Fernando Pessoa
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piano patterns n°6
03:10
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A única maneira de teres sensações novas é construires-te uma alma nova. Baldado esforço o teu se queres sentir outras coisas sem sentires de outra maneira, e sentires-te de outra maneira sem mudares de alma. Porque as coisas são como nós as sentimos — há quanto tempo sabes tu isto sem o saberes? — e o único modo de haver coisas novas, de sentir coisas novas é haver novidade no senti-las.
Mudar de alma. Como? Descobre-o tu.
Desde que nascemos até que morremos mudamos de alma lentamente, como do corpo. Arranja meio de tornar rápida essa mudança, como com certas doenças, ou certas convalescenças, rapidamente o corpo se nos muda.
Não descer nunca a fazer conferências para que não se julgue que temos opiniões, ou que descemos ao público para falar com ele. Se ele quiser que nos leia.
De mais a mais o conferenciador semelha actor — criatura que o bom artista despreza, moço de esquina da Arte.
Fernando Pessoa
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7. |
piano patterns n°7
04:20
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No soul more loving or tender than mine has ever existed, no soul so full of kindness, of pity, of all the things of tenderness and of love. Yet no soul is so lonely as mine — not lonely, be it noted, from exterior, but from interior circumstances. I mean this: together with my great tenderness and kindness an element of an entirely opposite kind entered into my character, an element of sadness, of self - centredness, of selfishness therefore, whose effect is two - fold: to warp and hinder the development and full internal play of those other qualities, and to hinder, by affecting the will depressingly, their full external play, their manifestation. I shall analyse this, one day I shall examine better, discriminate, the elements of my character, for my curiosity of all things, linked to my curiosity for myself and for my own character, leads to one attempt to understand my personality.
*
It was on account of these characteristics that I wrote, describing myself, in The Writers Day:
One like Rousseau...
A misanthropic lover of mankind.
I have, as a matter of fact, many, too many affinities with Rousseau. In certain things our characters are identical. The warm, intense, inexpressible love of mankind, and the portion of selfishness balancing it — this is a fundamental characteristic of his character and, as well, of mine.
Fernando Pessoa (original in english)
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8. |
piano patterns n°8
04:10
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Meu pensamento é um rio subterrâneo.
Para que terras vai e donde vem?
Não sei... Na noite em que o meu ser o tem
Emerge dele um ruído subitâneo
De origens no Mistério extraviadas
De eu compreendê-las..., misteriosas fontes
Habitando a distância de ermos montes
Onde os momentos são a Deus chegados...
De vez em quando luze em minha mágoa
Como um farol num mar desconhecido
Um movimento de correr, perdido
Em mim, um pálido soluço de água...
E eu relembro de tempos mais antigos
Que a minha consciência da ilusão
Águas divinas percorrendo o chão
De verdores uníssonos e amigos,
E a ideia de uma Pátria anterior
À forma consciente do meu ser
Dói‑me no que desejo, e vem bater
Como uma onda de encontro à minha dor.
Escuto‑o... Ao longe, no meu vago tacto
Da minha alma, perdido som incerto,
Como um eterno rio indescoberto,
Mais que a ideia de rio certo e abstracto...
E p'ra onde é que ele vai, que se extravia
Do meu ouvi‑lo ? A que cavernas desce?
Em que frios de Assombro é que arrefece?
De que névoas soturnas se anuvia?
Não sei... Eu perco‑o... E outra vez regressa
A luz e a cor do mundo claro e actual,
E na interior distância do meu Real
Como se a alma acabasse, o rio cessa...
Fernando Pessoa
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Walter Fini - Stormi
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Walter Fini - Um passeio
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GLSmyth - Six Emotions
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Rocco Saviano - Swelling
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Marco Lucchi Modena, Italy
a mellow artist aging 66. He loves and releases eclectic music that goes from post-classical to drone. His fav device is the mellotron.
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